Hoje, ser nerd é legal, é bem visto. Pessoas que curtem tecnologia, games, quadrinhos e filmes de ficção científica fazem sucesso. Se assumir nerd conta pontos no LinkedIn, no Instagram, no Twitter e até mesmo no Tinder. Mas nem sempre foi assim. Quando eu era criança, no começo dos longínquos anos 1990, não existia essa história de “orgulho nerd”. Como nos filmes da Sessão da Tarde da época, os nerds eram alvo de zoação, na escola e onde mais fosse. Quem era nerd não ficava falando por aí: era nerd porque não conseguia ser de outro jeito. Era o meu caso. Como diriam os hipsters americanos, “I was nerd before it was cool”. Bem before.
Como qualquer nerd que se preze, eu adorava games. Mas a minha relação com eles era mais profunda, em todos os sentidos. Eu queria ver como os games eram por dentro, queria entender como funcionavam. Movido pela curiosidade, eu aprendi a hackear os games de computador debugando o software direto em linguagem de máquina e fazendo contas em hexadecimal. Não é exagero dizer que eu me divertia mais assim do que jogando.

A Inteligência Artificial – me desculpe a obviedade – tem esse nome porque é fabricada. É feita em laboratórios, é o Metaverso da Inteligência Natural à sua imagem e semelhança. A capacidade de analisar, de planejar, de prever, de sentir e de sonhar é o que melhor nos define como humanos. E o mais mágico de tudo isso, são as infinitas combinações que compõem cada um dos 7 bilhões de humanos do planeta. Essa característica é o que a Inteligência Artificial busca e aprimora a cada dia, adaptando-se a nós conforme a usamos. E como num oito sem fim, à medida que a humanidade amadurece em sua maturidade tecnológica, deixamos a infância de uma era para trás e mergulhamos em um novo mar de profundezas digitais.
Como humanos, devemos abraçar (ou dar braçadas) em cada nova onda. Vai fundo, nossos gadgets nos conhecem tão bem, não devemos nos intimidar com eles. É como estar numa roda de amigos. Nessa nova era, atravessamos a fronteira da Internet das Coisas para o Reino da Internet de Todas as Coisas, onde a inteligência digital é perfeitamente integrada em a tudo que nos cerca, das nossas paredes de casa às nossas reuniões, das aulas de ioga aos protestos políticos, das festas de família aos funerais, especialmente em tempos de distanciamento social.
Só é importante ter em mente uma coisa: a Inteligência Artificial modifica nossa relação e comunicação com o mundo e com as pessoas, mas não as substitui. O mesmo aplicativo que te indica ótimos filmes nunca vai ser a melhor companhia para assisti-los numa sexta-feira à noite. Como diria um artista japonês que agora eu não me lembro o nome: “o ser humano sempre irá precisar de algo para tocar”.

Falando em filme, já viu “Ela”? O longa do Spike Jonze fala exatamente isso. Joaquin Phoenix se apaixona por um aplicativo que simula uma namorada – interpretada pela voz da Scarlett Johansson, que nem precisa aparecer na tela para mostrar seu talento. Conforme o programa vai sendo usado, como toda Inteligência Artificial, a namorada virtual vai se aproximando dos sonhos do personagem de Phoenix. “Ela” se passa num futuro não muito distante, muito parecido com o nosso presente, em que as pessoas se distanciaram uma das outras, trocando-as por experiências como a vivida pelo protagonista.
A mensagem final do filme é clara: as possibilidades da Inteligência Artificial só serão infinitas se as capacidades da Inteligência Natural também forem.