Tem gente que, para se concentrar, precisa de silêncio – de preferência, absoluto. Eu não. Quando a gente ainda trabalhava em espaços coletivos – lembra? –, eu adorava ouvir as risadas, as conversas, os sons dos sapatos sobre o piso oco elevado, o som baixo que vinha do fone perto de mim. Aliás, era sempre um hardcore dramático, talvez fosse Evanescence na playlist. Enfim, todas aquelas vozes e sons acabavam compondo uma espécie de coro involuntário. Uma espécie de New Wave com Eletropop ZENVIA. Eu gosto. Prefiro sons à música. Quando eu realmente preciso me concentrar, apelo para os fones de ouvido com um belo isolamento acústico e para os Chemical Brothers.

Mesmo na calma do meu home office, eu convivo com barulho. Desse barulho, nem os fones nem os Chemical Brothers dão conta. Estou falando da quantidade de barulho de informação absurda que chega até nós a cada minuto. E elas aparecem de todas as partes, dos feeds das redes sociais, das janelas do WhatsApp, dos sites de notícias, dos posts do Twitter, das danças do Reels e até dos canais de TV – essa tecnologia arcaica, que eu já abandonei há pelo menos dez anos.
Nesse caso aqui, o som é outro. Muitas vozes diferentes, falando coisas diferentes, na maioria das vezes, contrárias. Vozes que não têm a mesma graça, a mesma musicalidade das vozes das pessoas que formam a ZENVIA. Acho que é porque, lá na ZENVIA, todas as vozes que se ouvem, embora não falem a mesma coisa, têm o mesmo objetivo. Mesmo que cada pessoa ou time trate do seu próprio projeto, todas as conversas giram em torno de como melhorar nossa comunicação, nossa relação com as pessoas. Tirando um ou outro, claro, que fala sobre uma série nova ou alguma fofoca. Afinal, como diria o Jack Torrance, personagem do Nicholson em “O Iluminado”: “Só trabalho sem diversão faz de Jack um bobão”. Quer saber? No final, o som dessa minha outra casa, que chamo de ZENVIA, parece bem com o som de uma família reunida aos domingos. Daquelas bem italianas, onde todo mundo fala, todo mundo grita, todo mundo ri ao mesmo tempo.
Mas falando em “todo mundo grita”, uma das coisas mais incríveis das redes sociais, talvez também seja um dos seus maiores problemas: com elas, toda desinformação é informação. E vice-versa. Sim, é ótimo que todos possam expressar sua opinião, mas uma opinião não é um fato. E vice-versa. E tudo isso é o problema – quando a opinião vira fato e o fato vira opinião, a música da vida desaparece, e o barulho pelo barulho acontece. Olha o que está acontecendo com a ciência. Toda essa epidemia de desinformação gerou um movimento contra as vacinas, e doenças graves (e evitáveis) como o sarampo, por exemplo, voltaram a ser motivo de preocupação global. Na Itália, o país que tem um barulhento e ativo movimento anti-vacinação (tido como o maior depois do dos Estados Unidos), há um considerável percentual de pais que declaram ter alguma “hesitação vacinal” — 15% do total, segundo estudo nacional de 2018 assinado por 14 pesquisadores. E não para por aí: a resistência à vacinação foi listada pela Organização Mundial da Saúde como uma das dez maiores ameaças à saúde global no ano de 2019.
Você deve ter algum exemplo bem perto. Aquele primo que largou a faculdade de administração no 3º ano e fala sobre infectologia com a mesma propriedade de um especialista. “Quem é esse cara, que se dedicou há 25 anos ao estudo do tema, pensa que é para achar que sabe?” Coisas desse tipo é o que se ouve por aí. A formação desse primo em infectologia, hoje, é reconhecida e legitimada como uma das mais conceituadas do mundo: aluno honorário da Universidade do WhatsApp.
O fato é: o excesso dos canais de informação pode acabar com os fatos. Quero dizer, ninguém mais precisa se conformar com o que não lhe agrade. Não gostou do que esse site/perfil diz? É só procurar outro, que vai lhe dizer exatamente o que você quer ouvir. Se está na internet, só pode ser verdade. Como lidar com isso? Minha dica é: de todo esse barulho, escolha bem o que você quer ouvir. Busque todas as fontes que puder, não uma, duas ou três, várias. Ser criterioso com os canais de informação, além de poupar seu tempo, te ajuda a evitar fake news. Selecionando bem seus conteúdos, por exemplo, você ganha horas para fazer outras coisas.

Por exemplo, permitindo-se deixar de lado o barulho das desinformações para escutar a música das coisas, das batidas das portas, do choro de fome do seu filho bebê, do microondas avisando que está pronto, das pessoas passando na calçada. Porque, como diria Aldous Huxley, um dos meus escritores preferidos: “Depois do silêncio, o que mais se aproxima de expressar o incomunicável, é a música.”